Inventário do Carnaval da Barra do Jucu
Este é o inventário participativo do carnaval da Barra do Jucu, iniciado em 2003 por Carlos Magno R. de Queiroz (CM), ao perceber que a história que estava sendo registrada, deveria ser preservada. Em 2010, criou o primeiro site do Bloco Surpresa, podendo finalmente difundir todo esse trabalho de resgate do carnaval barrense.
Aqui é possível encontrar relatos, entrevistas, fotos, vídeos, matérias de jornais e links diversos sobre o carnaval da Barra do Jucu. Uma rica história que torna o balneário de Vila Velha, um dos lugares de maior expressão cultural capixaba.
Interessados em participar desta iniciativa, favor enviar e-mail para blocosurpresa@gmail.com
1950 – Atual
Vaquinha, Mulinha & Mascarados
Há décadas, bois e máscaras fazem parte do carnaval da Barra do Jucu.
O boi, na história da humanidade, tem uma grande importância cultural em várias regiões do mundo, acompanham homens e mulheres como fonte de sustento e força motriz. Na Índia e em algumas regiões da África são animais sagrados, na Península Ibérica são símbolos de virilidade e força. Os portugueses trazem os primeiros bois para o Brasil na expedição de 1532, de Martin Afonso de Souza. A partir daí, a criação se espalha por todo o Brasil e passa a influenciar várias manifestações folclóricas (Bumba Meu Boi, Boi Pintadinho, Festival de Parintins, entre outros), chegando também ao carnaval da Barra do Jucu.
A foto acima represente a Vaquinha redecorada a cada ano.
As máscaras também acompanham a humanidade desde tempos remotos. Primeiro como símbolo ritualístico, de comunhão com o transcendental, onde encontra forte representação na África. Os gregos, através do teatro, utilizam como disfarce psicológico. Essa forma de utilização das máscaras chega aos carnavais europeus. Os portugueses vão trazer ao Brasil a tradição do entrudo carnavalesco que se utiliza de máscaras para participar das festas.
A foto acima representa máscaras confeccionadas pelas próprias pessoas da comunidade.
Com a presença dos escravos negros, as máscaras portuguesas incorporam forte influência Africana no Brasil, nos traços e no misticismo que as envolve. Também podemos notar a importante contribuição indígena no acabamento e decoração com tintas, vegetação e ossadas de animais, transformando-se em totem religioso. Essa mesclagem cultural vai compor a tradição folclórica de diversos pontos do país. Essas máscaras passaram a ser utilizadas em várias manifestações folclóricas do Brasil, como a Folia de Reis, o Reis de Bois, Congo de Roda D´água, Jaraguá, e com o tempo chegaram ao carnaval da Barra do Jucu.
Entrevistas realizadas com moradores antigos, por diversos pesquisadores do assunto, relatam que a brincadeira de mascarados no carnaval da Barra do Jucu remonta ao início do século XX. Diziam: “que período de carnaval aqui não tinha nada pra fazer, então eles brincavam de mascarados durante o carnaval”. Confeccionavam as máscaras com tiras de papel, cola de farinha de mandioca ou trigo sobre uma forma totêmica de barro, com pintura feita de tintas produzidas por eles mesmos a partir da vegetação local. Arrumavam qualquer roupa que os cobrisse o corpo inteiro, vestiam essas máscaras e saíam pelas ruas brincando, divertindo os adultos e assustando as crianças. No início eram poucos, cerca de uma dezena, número que aumentou conforme a comunidade cresceu.
A foto acima representa máscara com ossos de animais presentes na tradição barrense.
A primeira sátira do carnaval da Barra do Jucu teve início entre os brincantes de mascarados e foi protagonizada por Paulo Nunes, que confeccionou uma “cabeça” feita de papel para desfilar. Era uma fantasia do bandido Pedro Grosso, que reza a lenda, roubava e distribuía entre os pobres.
Naqueles tempos, as mulheres costumavam desfilar com máscaras feitas a partir de fronhas de travesseiros. Elas recortavam os furos na altura dos olhos e boca e amarravam prendedores de cabelo nas pontas da fronha acima da cabeça, formando uma espécie de orelha. Depois, algumas recebiam pintura. Essa também era uma forma de identificar mulheres mascaradas, mas também, nada impedia os homens de fazerem máscaras dessa forma e mulheres de fazerem máscaras de papel como as já descritas. Funcionava inclusive como forma de disfarçar-se ainda mais e incrementar a brincadeira. Para citar algumas participantes que nos relataram estas histórias: Ester Vieira e Lígia Maria.
Essas formações de mascaradas nunca foram proibidas no meio dos homens que saíam junto com a vaquinha, mas elas preferiam fazer o grupo delas e sair de locais dentro da própria Barra. Nas ruas elas se misturavam aos foliões e durante o desfile da Vaquinha ficavam próximas, ora se misturavam aos outros mascarados, ora não. A partir da década de 80, o número de mulheres mascaradas foi gradualmente diminuindo. Nos desfiles recentes podemos observar uma ou outra, que encontra o bloco dos mascarados já nas ruas. Por mais que as barrenses não participem, elas gostam e preferem em sua maior parte, prestigiar os mascarados na rua.
A imagem acima é da década de 80, com crianças mascaradas (localizada especialmente na Av. Ana Penha Barcelos, próximo a Praia do Barrão)
Fica difícil precisar com exatidão quando surgiram as alegorias da vaquinha e da mulinha no Bloco dos Mascarados do carnaval da Barra, entre as várias hipóteses desse surgimento, podemos citar: Máximo Araújo conta que em meados do século XX, ele e outros pescadores barrenses barquejaram o Rio Jucu para vender pescado em Vitória e lá presenciaram uma “brincadeira de boi” no carnaval da capital. Resolveram fazer a tal alegoria do boi no carnaval da Barra, que ganhou o nome de “vaquinha” e desfilou junto com esses mascarados pelas ruas da comunidade de surpresa, simulando uma “vaca brava”, correndo junto com os mascarados e avançando em cima dos foliões. O sucesso da brincadeira entre os barrenses foi tanto que nunca mais parou até os dias atuais. O primeiro que saiu no bojo dessa alegoria foi Haroldo Vieira.
Outra nova adaptação veio de Oscar Valadares, que confeccionou a alegoria de uma mula, vestida no corpo, na altura da cintura, chamada de “mulinha”. Essa mulinha representa o vaqueiro, que controla a vaca. Vacas soltas correndo pelas ruas e vaqueiros eram muito comuns na Barra do Jucu daqueles tempos, vez ou outra fugiam vacas de fazendas locais que vinham parar nas ruas. A comunidade era uma típica vila de pescadores com aspectos rurais.
Moradores locais relatam do pessoal das comunidades ribeirinhas (Itapuera, Jaguaruçu, Caçaroca, Araçatiba…) descerem o rio para passar o verão na Barra e curtir o carnaval, trazendo essas novidades para o balneário. Outros moradores dizem que as alegorias da vaquinha e da mulinha vieram das fazendas do entorno da Barra, inspiradas na presença das vacas nos pastos. Em Galvêas (2005, p. 160) lemos: “Incorporando a vaquinha pelo que constatei nas entrevistas, primeiro saiu Seu Dionísio de Itapuera; depois Seu Haroldo Vieira, por mais de 30 anos”.
Com o passar dos anos a comunidade cresceu, as crianças que não podiam brincar com os adultos organizaram suas turmas de mascarados, que por sua vez, vetavam crianças menores que organizavam novas turmas. Nesse período, a turma mais famosa, além da turma da vaquinha, era a de Wllisses Vieira, que circulou entre os anos 80.
A partir dos anos 80, chegaram as máscaras industriais, feitas de borracha, de monstros e bichos assustadores, inspirados na literatura e filmes de terror estrangeiros, fabricadas em outros estados, facilmente encontradas nas lojas. Os brincantes passaram a vestir essas máscaras e com o tempo boa parte da comunidade esqueceu-se do rito de confeccionar sua própria máscara.
Hoje o bloco da Vaquinha, Mulinha e Mascarados permanece com algumas dezenas de participantes e a brincadeira segue parecida com o Entrudo do carnaval colonial brasileiro.
O Bloco dos Mascarados ou Bloco da Vaquinha e da Mulinha é a manifestação mais tradicional do carnaval da Barra do Jucu. Caracteriza-se pelo uso de vestimenta e máscara para ocultar todo o corpo e disfarce pessoal, para provocar mistério e o não reconhecimento pelos demais foliões. O Bloco desfila toda segunda-feira de carnaval pelas ruas do bairro, a partir das 16 horas, mas a concentração começa logo cedo nas matas da região. Alguns mascarados saem às ruas nos demais dias da festa.
Os preparativos do carnaval dos mascarados na Barra do Jucu iniciam-se meses antes do dia do desfile, com a confecção das máscaras por pequenos grupos em casas e terrenos do bairro. No dia do desfile, a concentração acontece em pontos pré determinados nas matas que sobraram no entorno do balneário, principalmente na Reserva de Jacarenema, e também na restinga que se localiza entre a Barra e Praia dos Recifes.
Os brincantes chegam logo no início da manhã nesses locais e permanecem confraternizando, vestindo as fantasias e “aquecendo” para a folia. Isso, até o momento do desfile, no final da tarde. O cortejo, composto por mascarados e pela vaquinha, segue pelas ruas principais da Barra do Jucu, desde a Praça Pedro Valadares até a Praia do Barrão, podendo mudar conforme a vontade do grupo.
Créditos do Documentário: Carmen Filgueiras.
Monstros e lendas ganham contornos reais no carnaval.
A Barra do Jucu sempre foi cercada de matas, brejos, lagoas, mangues, rios e mar, o que torna forte a ligação entre homem e natureza. Quando não havia estradas e nem energia elétrica, e a principal via de comunicação com a cidade era o Rio Jucu, as pessoas se reuniam em volta das fogueiras, principalmente no início da noite, para contar histórias sobre monstros e lendas da região. No carnaval, os mascarados buscavam representar esses “bichos papões” do imaginário popular local nas máscaras e no comportamento.
Nesse costume, os adultos impedem as crianças de participar junto como mascarados, por diversos motivos. Com isso, as crianças que não podem sair com os adultos, saem às ruas no dia do desfile para implicar com os mascarados, que perseguem essas crianças. Com isso, a brincadeira tem tons de rito de passagem, com a criança enfrentando o monstro, e virando o próprio monstro para perseguir outras crianças à medida que cresce.
Mascarado, pé de pato, comedor de carrapato! – Cântico comum das crianças do bairro para ‘implicar’ com os mascarados durante o desfile.
Além do mais, o ato de se mascarar para o adulto é pura diversão e todo o contexto da brincadeira provoca uma mudança no comportamento de quem se mascara, que assume atitudes pueris e gaiatas. Divertindo-se e entretendo os foliões com as brincadeiras e o anonimato, gerando curiosidade na plateia que quer descobrir quem são os mascarados.
Parte da brincadeira é tentar descobrir quem está por trás das máscaras. Foto: autor desconhecido.
Os precursores do bloco
Fica difícil mencionar todos os participantes que já brincaram e brincam nessa celebração. Os primeiros mascarados foram moradores da comunidade como Alarico, Alberto, Alvino, Antônio Leão, Esmerino Laranja, Giovani, Paulo Nunes, Vicente, Haroldo Vieira, Máximo Araújo e Oscar Valadares. Na vaquinha, saíram Dionísio, Haroldo Vieira, Joel Leão (Joel 40), Andrade (Perereca), Rodrigo Rodrigues e Jean Ribeiro. Na mulinha, Oscar Valadares, Valter Vieira (Balunga), Jaime (feijão-tropeiro) e Gerson Vieira. Saiba mais sobre a história do Bloco dos Mascarados.
Hoje em dia uma nova geração de brincantes organiza a celebração: Rodrigo Rodrigues, Patrick Muniz, Greco Nogueira, Guilherme (Guigui), Vinícius Oliveira (Burrin) Jonas, Jaciel, Eduardo, Nelson Abelha, Carlos Magno (Lilico) Mosquito, Douglas Leão, Leandro Valadares, Leonardo Valadares, Homero Galvêas, Alexandre Galvêas, Márcio Figueiras, Tomaz Musso, Irio Leão, Marcelo Leão, Aldo (Canhão), Eli Tonassi, Pedro Leão, Willians Regis, Wallace Regis, Luiz Marcos (Marquinho Diabo), Denilson (Tufão), Jetinho, Washington, Maycon Corti, Matheus Corti, Murilo Corti, Erasmo Vieira, Lucas Vieira, Edgar Vieira, Helio Valadares, Joselito, Sidney de Almeida, Danilo de Almeida, Edson Vieira, Nanado, Jaison Nunes, Douglas Sampaio, Jocimar Nunes (Buchecha) e muitos outros.
Valter Balunga, com alguns ajudantes, restaura todo ano as alegorias da Vaquinha e Mulinha para o desfile. Vinícius Oliveira, Toninho Natural e Buchecha preservam a tradição de confeccionar as antigas máscaras folclóricas.
Reportagem do Jornal A Tribuna sobre a confecção de máscaras de carnaval (05/02/2016).
É tradição não deixar nenhuma parte do corpo a mostra, servindo qualquer vestimenta para isso. O macacão de chita, que é um tecido comum nas manifestações de cultura popular, é muito utilizado. Como acessórios, são utilizados chapéus de palha, vegetação (cipós, palhas e trepadeiras) para cobrir o corpo, cordas para laços, varas, capacetes de motocicletas com chifres bovinos, ombreiras de espumas, calçados resistentes, pintura corporal com carvão, picumã, tintas guache e acrílica, entre outros.
A comunicação é pouca: a ordem é brincar!
Os mascarados emitem uma espécie de pio agudo, “Thrúuuuu” que é a sua forma de se comunicar, simulando um ser místico da natureza. Outra forma de expressão sonora ocorre ao longo da correria da brincadeira. Os mascarados “trotam” os calçados (coturnos e botas em sua maioria) no chão fazendo barulho de tropa e gritam: “Hei! Hei! Hei! Hei! Hei!” esse barulho é feito para chamar a atenção do público de que o bloco se aproxima. O muleiro imita o vaqueiro se comunicando com a vaca e os mascarados verbalizam com a vaca para irritá-la.
Alegorias levam meses para ficar prontas
A preparação das alegorias da vaquinha e da mulinha e as máscaras dos mascarados começa meses antes do carnaval, confeccionadas por pequenos grupos em casas e terrenos no bairro. A vaquinha é composta por uma caveira bovina com os chifres, o corpo é formado por paus e arames, coberto com panos de chita. A caveira é preenchida com espumas e toda a estrutura é pintada, com o nome escolhido pra representar uma situação em todas as esferas, de local até internacional, ironizando algum fato importante ocorrido durante o tempo que precede a festa.
A mulinha é formada por um gancho de madeira vestido na altura da cintura preso ao corpo do muleiro por alças, de cabeça feita com panos e espumas e toda a alegoria é revestida com panos. No acabamento ela é pintada e recebe um nome no mesmo sentido da vaca. Oscar Valadares – o primeiro muleiro – se pintava com picumã.
Cabe realçar que as escolhas dos nomes das alegorias da vaquinha e da mulinha são sempre representativos de algum acontecimento de importância da história recente; a “vaca louca”, em homenagem a doença de mesmo nome que assolou a Europa, “Dilma” a presidente que perdeu o mandato, “Zica”, abordando o assunto do zica vírus, “Madalena”, em homenagem a música do congo. No início os nomes eram pueris: “mansinha”, “dengosa”. “manhosa”. Com o passar dos anos os temas se tornaram de cunho crítico, sobre a influência dos meios de comunicação, como a TV.
Créditos do Texto: Marcus Vinícius Machado de Oliveira.
Colaboração: Homero Bonadiman Galveas.
Crédito de Fotos: Flávia Bernardes.
Fonte: Museu Vivo da Barra do Jucu
19XX – Atual
Bloco da Lama
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1997 – 2005
Bloco Algazarra
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Outros Blocos
Bloco Tradição, Bloco Chupa + Não Baba, Bloco Atocha, Bloco Unidos da Barra, Bloco das Ciganas, Bloco da 3ª Idade
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2011 – Atual
Bloco dos Arteiros
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1985 – Atual
Bloco Surpresa
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